quarta-feira, 25 de abril de 2012

A beleza das heroínas de Jane Austen (parte 8)

"A beleza de Fanny Price"
   

"...parecia ter tanto medo de ser notada e elogiada como as outras mulheres têm medo de ser esquecidas." (Mansfield Park - cap. 21)

    Fanny Price é a mais polêmica das heroínas de Jane Austen, muitos até mesmo contestam esse título a ela. 
 Tadinha... Vejo Fanny como uma menina demasiadamente sofrida, tímida, introspectiva, sem coragem pra discordar de nada, (não que ela não tivesse sua maneira de ver a vida) até mesmo um tanto depressiva.
  Muitos leitores se irritam com o comportamento de Fanny e acham que um romance longo como "Mansfield Park" não merece uma heroína sem sal e sem açúcar como ela. Mas afinal: o que Jane Austen nos mostra com Fanny?
    Acredito que no quesito "beleza", Fanny  era  uma moça bonita, mas sua condição em casa dos Bertram, abafava sua beleza, até mesmo a interior. Não tinha muitas vaidades e sua timidez não deixava que ela fosse diferente, aliás, nem a timidez, nem Tia Norris, que fazia com que Fanny sempre lembrasse "onde era seu lugar", deixando claro que ela era inferior aos outros em seu redor. 


— Seu tio acha você muito bonita, Fanny — essa é que é a verdade... qualquer pessoa, menos você, havia de se ressentir por não ter sido achada muito bonita há mais tempo; mas a verdade é que seu tio até agora nunca a tinha admirado — e agora ele a admira. Sua pele está tão bonita! E você ganhou tanto em aspecto! E o seu porte — não, Fanny, não vire o rosto — é apenas um tio. Se você não pode suportar a admiração de um tio, que será de você? Você deve realmente ir se acostumando com a ideia de ser admirada. Deve se habituar a ser uma mulher bonita. 

— Oh! Não fale assim, não fale assim, exclamava Fanny, perturbada por sentimentos que ele não poderia adivinhar... (Edmund e Fanny - Mansfield Park)
Frances O'Connor, como Fanny, MP 1999

     Fanny Price, ao meu ver, é o oposto de Emma Woodhouse: enquanto Emma é rica, bonita, de excelente senso de humor, tem liberdade pra dizer o que quer, é admirada por todos e tem elevada auto-estima, Fanny é pobre, reservada, séria, não tem tempo para pensar em si, mostra muito pouco o que sente, tem medo de tudo o que fala, não tem liberdade no que diz, é humilhada e vítima de preconceitos e por conseguinte, tem sua auto-estima lá em baixo.
Sylvestra Le Touzel, como Fanny em MP 1983
     Jane Austen não nos mostra Fanny como  "Cinderela", a bela moça transformada em criada, Fanny era alguém comum, com atrativos que todos nós temos, uns mais, outros menos. Como é que a "pobrezinha" poderia tentar ser bonita, com as primas Maria e Julia consideradas muito melhores e com Mary Crawford, quase uma diva, admirada pelo primo que ela amava? Era batalha perdida.

     Aliás, esse tipo de "batalha" é bem semelhante em "Esposas e Filhas" (Elizabeth Gaskell), onde Molly observa sem ação, Cynthia, sua irmã (filha de sua madrasta), bela e devastadora de corações ficar noiva de Roger, a quem ela amava. Quieta e resignada, nada faz para que Roger perceba que Cynthia não será uma esposa adequada. Assim como Edmund, Roger no final, reconhece seu amor por Molly.
Molly e Roger
     Acho que qualquer um de nós na situação de vida de Fanny não conseguiria ser diferente. Apesar de tudo, ela sempre se mostra calma e lembra muito Anne Elliot, resignada, preocupada com os outros, de lado, desprezada, mas com belos sentimentos e um bom coração.
     Quanto à aparência física, imagino Fanny com os cabelos escuros como na versão de 1999 (embora não tenha gostado dessa versão; foge da obra verdadeira e é muito apelativa pra Jane Austen). Já a Fanny loira da versão de 2007 é um horror. Pra mim, nada a ver aquele cabelo com cara de descolorido e  a atriz Billie Piper não caiu bem no papel, sem contar que a versão também viaja...não é fiel à obra. 
Billie Piper como Fanny - MP 2007


     Acho que apesar de  ter os cabelos mais claros, a melhor Fanny é a de 1983, achei ela com todo esse aspecto de pessoa que faz tudo pra agradar e não consegue, sem contar que é a versão mais fiel ao livro.
    Bom, contudo, apesar de alguns até se irritarem pelo fato de que Fanny tenha se saído bem no final, acho que ela mereceu ter um final feliz, depois que quase todos, cheios de dinheiro e hipocrisia estavam quase desmoronados , Fanny ainda se conservava ali, com sua "tímida" beleza, que poucos conseguiram ver, além de Edmund Bertram.
fotos: serieuk.blogspot.com
         depoisdotrampo.com.br



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12 comentários:

  1. Patricia,

    você descreve Fanny com perfeição! E quando vi a versão de 83 também encontrei a Fanny mais próxima de minha imaginação.

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  2. Raquel,

    Obrigada. É realmente interessante essa coisa que a gente tem de imaginar uma personagem quando lê um livro. Se assistimos uma versão em que o ator não foi bem escolhido (ou não bate com nossas expectativas), perde totalmente a graça. Abç

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  3. Eu também adoro Fanny, e tbm acho que ela é muito incompreendida. Sendo que ela simplesmente é uma menina tímida, e que defende os seus princípios Já a horrenda Mary...bem, aqui na minha terra, ela teria um nome impronunciável hehehe

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  4. Daniela,


    Pois é, mas já li muito comentário dizendo que Fanny era uma personagem insuportável, pode? E afinal, onde é a sua terra, mora no Brasil? Abçs.

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  5. Eu gosto de Fanny.
    embora Mansfild não seja muito apreciada,nela se pode encontrar uma Jane com a perspicacia tão amadurecida como em persuasão.

    Fanny é uma garota em uma situação muito dificil, em uma sociedade em que entregar seu filhos para outros era comum e bem visto, ela na fragilidade e retraimento de Fanny , retratar os verdadeiros sentimentos dessas crianças e os males que viviam. A regeiçao e inferiorização marcam a vida dessa garota e mesmo assim ela consege vencer na constancia de seu amor e em sua humildade sem se contaminar com o amargor que sua situação a espunha.

    Não me joguem pedra,mas eu gosto mas dela que de Emma, na verdade só gosto de Emma quando ela descobre seu amor por Mr.K e passa a rever seus conceitos.

    O que prejudica Mansfild é a escolha do heroi um tanto superficial, acomodado e definitivamente cego Edmund, que recebeu mas do que mereceu.

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  6. Ester,

    É verdade. Edmund é meio superficial, mesmo. Acho que Fanny estava tão acostumada com aquilo que lhe "sobrava" que não teve seu orgulho ferido vendo seu amado admirando Mary Crawford. Foi só ele declarar seu amor que ela logo aceitou. Foi bom, pela humildade ela conseguiu ser feliz. Abçs.

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  7. Olá Patricia,

    Gostei bastante deste artigo pela sua comparação com outras heroínas de Jane Austen. Pertenço à equipa do Jane Austen Portugal e queria pedir-lhe autorização para incluir o seu artigo na próxima edição da Revista Online do Jane Austen Portugal, com os devidos créditos, obviamente.
    A Patrícia estaria interessada em permitir a publicação do seu artigo na nossa revista?

    Saudações Austenianas,

    Clara F.

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    1. Clara,

      para mim será uma honra! Há alguns meses pensei em escrever um artigo para quem sabe ser publicado na Revista Online do Jane Austen Portugal, mas não havia encontrado um assunto a desenvolver e obviamente queria fazer algo de qualidade. Já pensei nisso várias vezes... Esse convite me deixou muito feliz e honrada. Tem toda minha permissão. Mais detalhes estou à disposição. Obrigada. Sds,

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    2. Olá Patrícia!

      Ora essa :) Nós gostamos muito de receber participações de outras fãs de Jane Austen é uma mais valia para a nossa Revista! Assim sendo, posso lançar-lhe um desafio?
      Nós temos uma nova rubrica na Revista chamada "Cartas de Uma Janeitte" onde convidamos uma fã de Jane Austen a escrever uma carta ou para Jane Austen ou para qualquer personagem por ela criada. A Patrícia gostava de participar?
      Contacte-me para o janeaustenpt@sapo.pt para desenvolvermos melhor o assunto ok?

      beijinhos,
      Clara

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  8. A que eu mais achei bonita foi a Molly, mas essa versão não vi. Tou julgando pela foto que você colocou. Eu não suporto a Frances. Odeio ela em todos os filmes. Não sei muito bem o motivo, mas não gosto nem um pouco dela.

    Gosto da Billie Piper, mas convenhamos que os traços do rosto dela são muito grosseiros pra Fanny Price. Nada a ver. Sem contar a sobrancelha escura e o cabelo claro.

    Ainda não vi uma Fanny Price da qual gostasse de verdade.

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  9. Ana, também não gostei da Billie, mas sabe que você tem razão? A atriz que fez a Molly (Esposas e Filhas - Elizabeth Gaskell) caberia muito bem como Fanny Price, mas interessante que na versão de 1999, ela era Julia Bertram. Poderiam ter pensado melhor... Abçs.

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  10. Antes que leia o que escrevi abaixo, gostaria de dizer que não se trata de uma interpretação machista, como prevejo que muitas pessoas vão ler, é uma visão que considera os valores da sociedade da época que, boa ou má, era realidade.

    O texto está bom, mas quem o escreveu esqueceu de considerar algumas coisas. Por exemplo, Funny era bonita, isso é inegável, Jane Austem a fez para ser bonita em um meio que em a beleza era a principal qualidade da mulher: uma sociedade patriarcal, burguesa do inicio do seculo XIX ou final do século XVIII. O Jane tenta nos mostrar é que Funny conhece bem seu lugar, sabe que está ali sujeita a ao casamento, mas não o vê como seus parentes, um negócio, ou mesmo uma salvação da miséria financeira, ao custo de sujeitar-se a vontade de um homem. O casamento para Funny é a realização amorosa, uma concepção bastante romântica se considerarmos as visões clássicas de amor, mas não podemos esquecer que Jane esteve bem perto do Romantismo. Funny não é coitadinha, mas completamente consciente de que seu poder ali resume-se aos favores que pode obter de alguém que nem é seu parente sanguíneo, o marido de sua tia, Thomas Bertram. O sentimento que tenho ao pensar em Funny me faz pensar numa metáfora bem visual: imagine um animal de estimação preso em uma gaiola, completamente dependente, mas com total consciência da sua situação.
    No contexto do romance Mansfield Park, O poder reside no sexo masculino, a mulher só existe em função da necessidade masculina e Funny que é apenas uma agregada da família Bertram, ela praticamente não existe e com o pedido de casamento de Henry Crawford ela passa a existir para Lady Bertran, que enxerga sua beleza e passa a enxerga-la como mulher, e como mulher deve cumprir seu papel social, casar e ter filhos. Mas Funny apesar de cogitar casar com Henry, não desiste de seus reais sentimentos, cogita casar para ter o conforto do poder que seu marido carregaria, mas sabendo que se sentiria para sempre infeliz, ainda assim, por um golpe do destino (ou vontade de Jane de ver uma personagem tão parecida com ela mesma se sair vitoriosa com tanta resiliência) as intensões dos irmãos Crawford foram descobertas, em principal de Mary Crawford, que queria a fortuna dos Bertram ansiando a morte de Tom antes de casar-se com Edmund. Com os Crawford fora de Mansfield, Edmund poderia declarar seu amor por tanto tempo velado, e um final feliz aparece para a garota tacanha que não podia confiar em ninguém naquele lugar senão Edmund. Um casamento ideal, por amor, não por dinheiro, consciente e resignado, consensual e sem qualquer imposição social.

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