segunda-feira, 28 de julho de 2014

"Razão e sensibilidade" - A música como forma de aproximação nas obras de Jane Austen - parte final


"...Marianne tocou ao piano todas as músicas preferidas que costumava tocar para Willoughby, cantou todas as árias em que suas vozes soavam perfeita e alegremente unidas...."

     Em "Razão e Sensibilidade", Jane Austen nos mostra uma heroína talentosa com a música. Marianne era excelente pianista, cujas interpretações eram admiradas por todos. O piano, era para ela um companheiro e nos momentos de desapontamento em que passou com Willoughby foi seu amigo, fazendo da música um grande consolo.



Marianne achava que a música não tinha muita influência sobre Edward...
      - Talvez - confessou Marianne - eu tenha recebido essa notícia com alguma surpresa. Edward é muito querido e eu o amo com ternura. No entanto... há alguma coisa que lhe falta... Sua aparência não é impressionante; ele não tem aquele encanto que eu esperava no homem destinado a ligar-se seriamente a minha irmã. Falta em seus olhos todo aquele espírito, aquele fogo que ao mesmo tempo revela virtude e inteligência. E, além de tudo isto, tenho medo, mamã, que ele não tenha bom gosto. A música parece exercer pouca atração sobre Edward e, se bem que ele admire muito os desenhos de Elinor, não se trata da admiração de uma pessoa que pode entender seu valor. (pág.10)


...e ainda pensava que a música era uma espécie de sintonia entre os casais...
     Eu não poderia ser feliz com um homem cujo gosto não coincidisse com o meu em todos os pontos; ele precisará participar dos meus sentimentos; os mesmos livros e as mesmas músicas deverão encantar a nós dois. (pág.10)


Talvez pelo mesmo motivo (pela falta de interesse do marido) a Lady Middleton abandonara a música depois de casada...
   Nessa noite, como alguém comentasse que Marianne estudara música, ela foi convidada a tocar. O piano foi aberto, todos se prepararam para ficar encantados e Marianne, que cantava muito bem, foi solicitada a tocar e cantar as músicas que Lady Middleton havia trazido para aquela casa ao se casar e cujas partituras tinham permanecido na mesma posição em que as colocara no instrumento, pois a anfitriã celebrara o casamento abandonando a música; no entanto, de acordo com as afirmativas de sua mãe, ela tocava muito bem e, segundo a própria Lady, gostava muito de tocar. (pág.20)



Marianne foi admirada por Sir John e Coronel Brandon por seus dotes musicais...
    A performance de Marianne foi aplaudida com entusiasmo. Sir John expressava sua admiração em altos brados cada vez que uma canção terminava e conversava em voz bem alta durante a execução de cada uma. Lady Middleton o repreendia a todo instante, comentando não entender como a atenção de alguém podia desligar-se da música por um momento que fosse e pedia a Marianne que cantasse determinada canção quando ela acabara de cantá-la. Apenas o coronel Brandon ouvia atento o tempo todo, sem demonstrações exageradas, e oferecia a Marianne o cumprimento da atenção, fazendo com que ela o respeitasse em meio aos outros, que evidenciavam uma vergonhosa falta de bom gosto.(pág.20)



A admiração do Coronel Brandon por Marianne era ainda maior por sua interpretação musical. A sintonia de gostos que ela almejava num casal, ele já estava certo de ter encontrado junto dela...  
     O prazer que ele demonstrava ao ouvir música, se bem que não fosse aquele êxtase encantado que pertencia apenas a ela, tornava-se precioso em contraste com a horrível insensibilidade dos outros, e Marianne era razoável o bastante para reconhecer que um homem com trinta e cinco anos podia ainda ter sentimentos profundos e admirar coisas lindas a ponto de se emocionar.(pág.20)


Marianne se encantou ainda mais quando Willoughby se declarou apaixonado por música...
    Willoughby... aparência de cavalheiro perfeitamente bem-educado ele unia franqueza, vivacidade e, acima de tudo, quando declarou que era apaixonado por música e dança, Marianne endereçou-lhe um olhar de aprovação tão profundo que garantiu para si a atenção dele em todas as demais conversas que decorreram durante a visita.(pág.27)


...e outras afinidades entre Marianne e Willoughby...
     Com grande rapidez descobriram que o gosto pela dança e a música era mútuo, o que fez com que nascesse uma conformidade geral de julgamento em tudo que se relacionasse a essas diversões.(pág.27)

    O convívio deles foi-se tornando aos poucos o prazer mais importante para ela. Liam, conversavam, cantavam juntos; o talento musical de Willoughby era considerável e ele lia com a sensibilidade e emoção que, infelizmente, faltava a Edward.(pág.28)

...a música e o piano unindo ainda mais o jovem casal...
      Muitas observações, então, foram feitas a respeito da chuva pelos dois. Willoughby abriu o piano e pediu a Marianne que fosse sentar-se a ele, o que fez com que diferentes pessoas se desinteressassem do tema, que caiu por terra. Mas não foi fácil para Elinor recuperar-se da agitação que despertara nela.(pág.35)



...o piano trazendo as lembranças de Willoughby...
  A tarde passou naquele mesmo clima de sensibilidade profunda. Marianne tocou ao piano todas as músicas preferidas que costumava tocar para Willoughby, cantou todas as árias em que suas vozes soavam perfeita e alegremente unidas. Houve momentos em que permaneceu imóvel como uma estátua, fitando perdidamente as linhas das músicas que ele havia escrito para ela, até que seu coração ficou tão pesado que seria impossível suportar mais tristeza.

...e continuou nos dias em que se seguiram...
   Esse constante alimentar da dor profunda continuou nos dias seguintes. Marianne passava horas ao piano, chorando e cantando alternadamente, a voz em certos momentos completamente afogada por lágrimas. Também nos livros, como na música, ela provocava um sofrimento intenso e profundo comparando os contrastes entre o passado e o presente. Lia apenas e somente os livros que eles tinham lido juntos.(pág.48)




...a viagem a Londres, trazendo a possibilidade maravilhosa de adquirir novas partituras musicais...
    - Que maravilhas faria uma viagem desta família riquíssima a Londres! - acrescentou Edward. - Que dia feliz para os vendedores de livros, de partituras musicais, para os donos de lojas de artigos para pintores! A srta. Dashwood daria ordem para as lojas lhe enviarem toda novidade que aparecesse em matéria de telas, tintas e pincéis... Não haveria músicas suficientes em Londres para contentar Marianne, conheço bem a grandeza de sua alma, assim como livros!(pág.53)

...o piano nos momentos de irritação de Marianne...
    Lady Middleton propôs às demais que jogassem rubber. Nenhuma se opôs, a não ser Marianne que, com sua habitual falta de respeito às normas gerais da boa educação, exclamou:
- Minha cara Lady, a senhora sabe que tenho um bom motivo para recusar, uma vez que detesto baralho. Prefiro tocar piano; ainda não experimentei o seu desde que ele foi afinado. E, sem maiores cerimônias, ela dirigiu-se ao piano.
    Lady Middleton fez uma expressão que indicava estar agradecendo a Deus por jamais ter sido assim tão rude com alguém.
- Marianne não consegue ficar perto do seu piano sem tocar, a senhora sabe, Lady Middleton... - Elinor tentou suavizar a ofensa. - E eu a entendo perfeitamente, pois trata-se do melhor piano que já ouvi até agora.(pág.81)


...a eterna companhia...  
     Ao piano, Marianne empolgou-se com sua música e seus pensamentos, esquecendo-se de todas as pessoas que se achavam na sala, e o instrumento localizava-se muito perto das duas moças que trabalhavam. Então, a Srta. Dashwood concluiu que, com todo aquele barulho, poderia conversar com Lucy sobre o assunto que tanto a interessava sem que corressem o risco de serem ouvidas na mesa de jogo.(pág.82)


...a música animando os serões e unindo as pessoas...   
   Os acontecimentos da noite não foram importantes. Essa festa, como todas as outras noitadas musicais, reunia muitas pessoas que gostavam de fazer grandes performances, porém a maior parte delas não fazia, de modo algum, nada que pudesse ser de fato denominado performance. Os músicos eram, geralmente em sua própria opinião e na opinião de seus amigos mais chegados, os maiores artistas amadores da Inglaterra.(pág.142)


...dedicar-se à música e à leitura ajudaria esquecer Willoughby...
     ...Tenho a intenção de me levantar sempre antes das seis e dessa hora até o jantar pretendo dividir cada momento entre a música e a leitura. Planejei tudo e estou determinada a seguir um curso de estudo sério. Nossa biblioteca já é bem conhecida por mim para que eu a consulte para algo além de mero entretenimento. Mas existem obras que vale a pena ler, em Barton Park, e há outras, mais modernas, que sei que posso pedir emprestadas ao Cel. Brandon. Lendo apenas seis horas por dia, no decorrer de doze meses ganharei boa parte da instrução que desejo.(pág.196)

...a música lembrava Willoughby...
     Depois do jantar, Marianne sentou-se ao piano para tocar. Mas a partitura sobre a qual seus olhos pousaram foi a de uma ópera que Willoughby lhe comprara e que continha alguns de seus duetos preferidos; na capa, seu nome estava escrito com a letra do jovem cavalheiro. Isso já era demais! Ela balançou a cabeça, colocou a partitura de lado, dedilhou algumas teclas e, em seguida, reclamando de fraqueza nos dedos, fechou a tampa do instrumento - mas não sem antes declarar que no futuro iria praticar bastante.(pág.196)

     Em todas as obras de Jane Austen, não há outra heroína tão dedicada e movida sentimentalmente pela musica quanto Marianne em "Razão e sensibilidade". Ela percorreu com essa arte e com seu instrumento, todo o percurso de suas mais profundas vontades, decepções,  e realizações.

Fotos:
Adaptações de "Razão e sensibilidade" - 1981, 1995, e 2008.