domingo, 15 de junho de 2014

"Orgulho e preconceito" - A música como forma de aproximação nas obras de Jane Austen -parte 1


     "Orgulho e preconceito" é sem dúvida, a obra mais famosa de Jane Austen e por esse motivo não era de se espantar que tivesse tido mais músicas compostas para suas adaptações em filmes e séries. A trilha sonora da adaptação de 2005 é maravilhosa, e a da série de 1995 também não fica atrás! 
  Além da trilha, que é de suma importância no decorrer de uma cena, a música "real", digo, a tocada e vivida nos tempos de Jane Austen (e de Elizabeth Bennet e Mr. Darcy) era de fato muito importante.
     Na cena acima, da adaptação de O&P de 2005, Lizzie afirma para Darcy que a dança é melhor do que a poesia em uma aproximação. 
      A música sempre nos foi (e é) importante! Quem não se lembra de algo quando escuta uma música? Ela mexe fortemente com nossas emoções! E "naqueles tempos", em que as pessoas tinham que ser apresentadas antes de dizer se quer "olá", era utilizada fortemente como forma de aproximação, principalmente entre os jovens. Lembra da cena em que Elizabeth Bennet aproveita sua vez na dança com Mr. Darcy para poder lhe dizer "umas"? 


     Há no livro, inúmeras situações de aproximação, conflito e impasse em que a música é a principal testemunha:


Charlotte Lucas para Lizzie
— Breve vai chegar a sua vez de ser provocada — disse Miss Lucas. — Eu vou abrir o piano, Eliza, e você sabe o que a espera.
— Você é uma amiga estranha; sempre querendo que eu toque e cante diante de todo mundo. Se a minha vaidade tivesse tendência musical, você seria preciosa, mas como este não é o caso eu preferia não me exibir diante de pessoas que estão habituadas a ouvir os melhores concertistas.
E como Miss Lucas insistisse, ela acrescentou:
— Muito bem. Se não há outro jeito...
E, olhando gravemente para Mr. Darcy, continuou:
— Há um velho provérbio que todos aqui naturalmente conhecem: "Guarde o seu sopro para esfriar o seu caldo". Eu conservarei o meu para cantar.(pág.28)


Lizzie e Mary
     A sua atuação como cantora foi agradável, embora de nenhum modo excepcional. Depois de uma ou duas canções, e antes que pudesse responder aos pedidos de várias pessoas que queriam ouvi-la novamente, Elizabeth teve de ceder o lugar à sua irmã Mary, que esperava com impaciência, pois, faltando-lhe todos os atrativos, estudara com grande aplicação e estava por-tanto sempre pronta a exibir-se...Embora não tocasse tão bem, Elizabeth agradou muito mais, graças à sua naturalidade...(pág. 28)

Mary e a música
     Mary não tinha talento, nem gosto. Embora a vaidade lhe tivesse dado perseverança, dera-lhe igualmente um ar pedante de maneiras convencidas, coisa suficiente para obscurecer triunfos maiores do que aqueles que era capaz de alcançar...Mary, depois de um longo concerto, pôde considerar-se feliz por alcançar alguns elogios graças a algumas canções escocesas e irlandesas que executou...Mr. Darcy ficou próximo a eles, cheio de silenciosa indignação, diante de uma maneira tão grosseira de passar a noite... (pág. 28)


Miss Bingley, sobre Georgiana
— Queria muito tornar a vê-la. Nunca encontrei uma pessoa tão encantadora. Que modos, que delicadeza... E como é prendada para a idade! Toca piano divinamente.(pág.41)
Georgiana abraçando o irmão (Mr. Darcy)
que lhe deu um piano novo como presente

Miss Bingley sobre a formação musical das mulheres

 - Nenhuma mulher pode ser realmente considerada completa se não se elevar muito acima da média. Uma mulher deve conhecer bem a música, deve saber cantar, desenhar, dançar e falar as línguas modernas, a fim de merecer esse qualificativo, e além disso, para não o merecer senão pela metade, é preciso que possua um certo quê na maneira de andar, no tom da voz e no modo de exprimir-se. (pág. 42)


A música aproximando o grupo e fazendo fundo às observações de Mr. Darcy
Finda esta ocupação pediu a Miss Bingley e a Elizabeth que executassem um pouco de música. Miss Bingley se dirigiu alegremente para o piano e, depois de um amável oferecimento a Elizabeth para que ela começasse, oferecimento que a outra rejeitou, com a mesma amabilidade e maior ênfase, sentou-se e começou. Mrs. Hurst cantou com a irmã e, enquanto isto, Elizabeth, que folheava cadernos de música que estavam sobre o piano, não pôde deixar de observar que os olhos de Mr. Darcy se voltavam freqüentemente na sua direção.(pág. 52)


O show de Mary (que ao invés de aproximar, repeliu as pessoas)

     ...Mas não durou muito tempo a sua tranqüilidade, pois acabado o jantar falaram em música. E ela teve a mortificação de ver Mary, depois de ligeira insistência, se preparar para responder ao apelo dos convidados. 

     Tentou, por olhares significativos e mudos apelos, impedir que a irmã desse essa prova de boa vontade. Mas em vão. Mary não compreendia os seus sinais. Uma tal oportunidade de exibir-se era-lhe deliciosa e ela começou a cantar... Ouviu as várias estrofes com uma impaciência muito mal contida, pois Mary, ao perceber entre os agradecimentos a sugestão de que ela pudesse ser instada a renovar o prazer que estava dando aos seus ouvintes, recomeçou a cantar, depois de uma pausa de meio minuto. 


     As forças de Mary não estavam absolutamente à altura de um tal feito; sua voz tornou-se fraca, seus gestos afetados...Olhou para Jane a fim de ver como é que ela suportava aquilo, mas Jane conversava discretamente com Bingley. Olhou para as duas irmãs e viu que elas faziam sinais uma para a outra, caçoando de Mary. Darcy continuava, porém, impenetravelmente grave. 


      Elizabeth olhou para o pai, a fim de suplicar a sua interferência, caso Mary se propusesse cantar a noite inteira. Ele compreendeu o gesto e quando Mary acabou de cantar pela segunda vez, disse, em voz alta:
— Isto basta, minha filha. Você cantou muito bem e nos deleitou a todos. Agora deixe as outras moças brilharem.

Mr.Collins, o aspirante

— Se eu tivesse a sorte de saber cantar — disse Mr. Collins —, estou certo de que teria o maior gosto de dar aos ilustres presentes o prazer de uma ária, pois considero a música um passatempo muito inocente e
perfeitamente compatível com a profissão de um sacerdote. Não quero afirmar entretanto que seja justo dedicar todo o nosso tempo à música, pois existem, é claro, outros deveres. (pág. 97)

Lady Catherine de Bourgh, sobre a formação musical de Elizabeth

Sabe tocar piano e cantar, Miss Bennet?
— Um pouco.
— Então, um dia destes precisa nos dar este prazer. O nosso instrumento é dos melhores. Provavelmente superior ao... Precisa experimentá-lo qualquer dia. As suas irmãs também sabem tocar e cantar?
— Uma delas sabe.
— Por que as outras também não aprenderam? Deviam todas saber música. As senhoritas Webbs todas sabem tocar. E o pai delas não tinha tanto rendimento quanto o seu. Sabe desenhar?
— Não, senhora.
— O quê? Nenhuma de vocês?
— Nenhuma.
— Isto é muito curioso. Mas com certeza não tiveram oportunidade. Sua mãe devia ter levado vocês todas as primaveras para a cidade, para tomar lições.(pág.150)
Mr. Darcy fica encantado ao ver Lizzie tocando e
 cantando, mesmo não sendo ela muito talentosa

Quando o assunto é musica, sem dúvida é algo importante!

...dentro em pouco tornou-se evidente que Lady Catherine compartilhava dos sentimentos do sobrinho, pois exclamou, sem nenhuma reserva:
— Que é que você estava dizendo, Fitzwilliam? De que é que vocês conversavam? Que é que você estava contando para Miss Bennet? Quero saber o que é.
— Estávamos falando de música — disse ele, impossibilitado de se esquivar a uma resposta.
— De música? Então fale em voz alta. É de todos os assuntos o meu favorito. Se estão falando de música, quero tomar parte na conversa. Creio que existem poucas pessoas na Inglaterra que apreciam mais a música do que eu. Ou que tenha um gosto mais fino.(pág. 158)


Lady Catherine de Bourgh sobre seu gosto musical, a falta de oportunidade da filha...
Se eu tivesse aprendido música, seria uma grande intérprete. E Anne também, aliás, se a saúde dela o tivesse permitido. Estou certa de que ela tocaria admiravelmente. (pág. 157)

...sobre os progressos de Georgiana com a música

Georgiana tem feito muitos progressos, Darcy?
Mr. Darcy louvou afetuosamente o talento da irmã.
— Estou muito satisfeita com isto — disse Lady Catherine; — diga a ela que nunca poderá brilhar se não estudar muito.
— Eu lhe asseguro, minha tia — replicou ele —, que ela não precisa de tal conselho. Estuda com muita constância.
— Tanto melhor. Nunca é demais. E na próxima vez que escrever para ela recomendarei que não se descuide do seu piano.(pág.157)

e sobre a falta de dedicação de Miss Bennet ao piano

Eu sempre digo às moças que nenhuma distinção pode ser alcançada sem um estudo constante. Já disse a Miss Bennet várias vezes que nunca tocará realmente bem se não estudar mais. E como não há piano em casa de Mrs. Collins, ela está convidada, com já disse muitas vezes, a vir a Rosings todos os dias estudar piano no quarto de Mrs. Jenkinson. Naquela parte da casa ela não incomodaria a ninguém.(pág. 157)


Elizabeth não escapa de tocar

Depois do café, o Coronel Fitzwilliam lembrou a Elizabeth a sua promessa de tocar para eles; e a moça se sentou imediatamente ao piano. Ele aproximou a sua cadeira. Lady Catherine ouviu metade de uma canção e em seguida continuou a conversar como antes com o outro sobrinho, até que este se afastou dela e, dirigindo-se resolutamente ao piano, colocou-se de modo a poder observar o rosto da bela executante. Elizabeth percebeu o que ele estava fazendo e, na primeira pausa, virou-se para ele e disse, com um sorriso malicioso:
— É para me assustar, Mr. Darcy, que se aproximou com toda esta imponência? Mas não ficarei alarmada, embora a sua irmã toque tão bem. Tenho uma persistência que a vontade dos outros é incapaz de intimidar. Nesses momentos a minha coragem sempre me socorre.(pág.157)
As irmãs Bingley, escutando Lizzie (e se mordendo de inveja)

Mrs. Reynolds, governanta de Pemberey, sobre Georgiana
Mrs. Reynolds, então, chamou a atenção dos visitantes para um retrato de Miss Darcy pintado quando ela tinha apenas oito anos de idade.
— E Miss Darcy também é bonita? — perguntou Mr. Gardiner.
— Oh, sim, é a menina mais bonita que eu jamais vi. É tão instruída! Toca piano e canta o dia inteiro. Na sala ao lado, há um novo instrumento que acaba de chegar para ela. Um presente do meu patrão.(pág.217)


   Já fui a vários Saraus, daqueles "tipo de antigamente", onde se toca, canta e até leem poesia e afirmo que é muuuiiito bom. Por isso posso dizer que realmente a música (de qualidade) aproxima as pessoas, quem não toca, pode ouvir e também se deliciar igualmente...

6 comentários:

  1. Patrícia,
    fico pensando como eu poderia arrumar um casamento nessa época pois sou um zero total em termos de música. Acho seria uma Catherine Morland um tanto quanto estabanada. Ótimo post, querida. Vou dar publicidade na página do blog no Facebook pois o blog está muito atrasado.
    um abraço, raquel

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    1. Raquel,

      Obrigada pela divulgação! Quanto à música, veja o exemplo de Elizabeth Bennet, não era lá essas coisas com a música , mas suas outras qualidades tão conhecidas, conquistaram Mr. Darcy! Não será esse também seu caso? Bjos,

      Patrícia

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  2. Amo o livro Orgulho e Preconceito e durante uma das minha buscas na net, encontrei este site e gostei muito dos seus textos.
    Sobre a música, vc tem toda a razão. Sem ela, a vida seria chata demais, mas o que mas me incomoda é que apesar de eu amar tanto ela, eu não tive oportunidade alguma de aprender piano nem quando era criança e muito menos agora. Meu coração até dói quando vejo alguém tocar piano, fico pensando no quanto eu queria saber tocar também e que mesmo trabalhando agora, não tenho tempo nem dinheiro para tal. É difícil amar a música e não ser amada por ela!

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    1. Lucia,

      tire isso de sua mente! A gente sempre consegue, se persistir! Não há nada de sobrenatural em tocar, mas dedicação e não é tanta assim não, viu, sou professora de piano, teclado há mais de vinte anos...e posso te dizer que basta um pouco por dia e tudo se faz. Aquela coisa de que piano é coisa cara, também não existe, dá pra comprar com algumas economias um piano legalzinho pra estudar e se deliciar (muito melhor do que o Jane Austen possuiu) lembre-se que aprender a nadar e ser um medalhista olímpico é coisa bem diferente e assim também é com a música, aprender a tocar e ser um virtuose idem, por isso há muitas pessoas que tocam super bem e nem por isso se apresentam no Municipal. Posso te assegurar que é tremendamente gratificante! Bjos, volte sempre,

      Patrícia

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    2. Obrigada.
      Que Deus te abençoe!

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    3. Lucia

      Amém!!! A vc também!!! Bjos,

      Patrícia

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